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Pejotização e o Trabalhador Autônomo

Por Mathias Cardoso Advogados

No cenário empresarial brasileiro, a busca por eficiência, redução de custos e otimização tributária tem levado muitas empresas e profissionais liberais a adotarem a chamada “pejotização”. Esse termo, derivado da sigla PJ (Pessoa Jurídica), refere-se ao ato de converter uma relação de trabalho ou prestação de serviços em uma relação jurídica entre uma empresa (Pessoa Jurídica) e o profissional, conhecido como PJ.

Neste artigo, abordaremos o conceito de pejotização, suas vantagens e desvantagens, bem como os aspectos relevantes que devem ser considerados por empresas e profissionais ao optarem por essa prática.

O que é Pejotização?

A pejotização, também conhecida como “pejotismo” ou “PJização”, ocorre quando um profissional, independentemente de ter sido um empregado ou prestador de serviços autônomo, decide constituir uma empresa em seu nome ou se associar a uma já existente para prestar seus serviços como pessoa jurídica. Dessa forma, em vez de receber seus honorários ou salários como pessoa física, passa a emitir notas fiscais como pessoa jurídica.

O Princípio da Primazia da Realidade em conjunto com o  artigo 3º da CLT, considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Esse princípio estabelece que a verdade real deve prevalecer sobre a forma como uma relação de trabalho é constituída. Ou seja, mesmo que o profissional tenha formalizado sua atuação como pessoa jurídica, a Justiça pode reconhecer o vínculo de emprego se os elementos essenciais da relação trabalhista estiverem presentes, como pessoalidade, habitualidade, subordinação e onerosidade.

É importante que tanto as empresas quanto os profissionais considerem o princípio da primazia da realidade ao optarem pela pejotização, garantindo que a relação de trabalho seja adequadamente caracterizada e que os direitos trabalhistas sejam respeitados.

Vantagens da Pejotização

  • Redução da carga tributária: A pejotização permite ao profissional ou empresa enquadrar-se em um regime tributário mais favorável, como o Simples Nacional ou o Lucro Presumido, o que pode resultar em uma carga tributária menor em comparação com a tributação sobre o trabalho assalariado.
  • Flexibilidade contratual: A relação entre a empresa contratante e a pessoa jurídica contratada oferece maior flexibilidade nos termos do contrato, permitindo negociações específicas para cada projeto ou serviço.
  • Possibilidade de deduções fiscais: Empresas podem deduzir os pagamentos feitos a pessoas jurídicas como despesas operacionais, reduzindo sua base tributável.
  • Proteção patrimonial: Ao atuar como pessoa jurídica, o profissional separa seu patrimônio pessoal do patrimônio da empresa, o que pode oferecer maior proteção contra eventuais dívidas e litígios.

Desvantagens da Pejotização:

  • Encargos e burocracia: A constituição e manutenção de uma empresa envolvem custos e obrigações, como a necessidade de um contador, cumprimento de obrigações acessórias e pagamento de taxas.
  • Riscos trabalhistas: Dependendo da natureza do trabalho realizado e da relação contratual, a Justiça pode interpretar a relação como uma fraude trabalhista, resultando em demandas judiciais e autuações.
  • Direitos trabalhistas limitados: A pessoa jurídica contratada não possui os mesmos direitos trabalhistas de um empregado, como férias remuneradas, décimo terceiro salário, entre outros.
  • Restrições em contratos com órgãos públicos: Em alguns casos, a contratação de pessoas jurídicas pode ser limitada ou vedada em contratos com órgãos públicos.

Entenda na prática!

Recentemente, a renomada emissora de televisão brasileira, a TV Globo, se viu envolvida em uma polêmica relacionada a uma acusação de fraude trabalhista. O ex-apresentador Lair Rennó, conhecido por seu trabalho no programa “Encontro com Fátima Bernardes”, moveu uma ação judicial contra a empresa após ser desligado do quadro de funcionários.

Segundo informações divulgadas pela mídia, Lair Rennó alegou que a TV Globo utilizou a pejotização para encerrar seu contrato de trabalho sem conceder-lhe os direitos trabalhistas adequados. A pejotização nesse contexto refere-se à prática em que a emissora contratou Lair Rennó como pessoa jurídica (PJ) em vez de mantê-lo como funcionário registrado (CLT).

A acusação de fraude trabalhista baseou-se no argumento de que a relação de trabalho entre Lair Rennó e a TV Globo era, na verdade, de natureza empregatícia, caracterizando um vínculo de emprego, e não uma relação entre uma empresa e uma pessoa jurídica prestadora de serviços.

Decisão Judicial e Consequências

Após o desenrolar do processo, a decisão foi favorável ao ex-apresentador Lair Rennó. O tribunal entendeu que a emissora, ao utilizar a pejotização como forma de encerrar o contrato de trabalho, violou os direitos trabalhistas do profissional, uma vez que a relação empregatícia não foi devidamente reconhecida e seus direitos foram negligenciados.

Como resultado, a TV Globo foi condenada a pagar uma indenização milionária a Lair Rennó, compreendendo valores relativos a verbas rescisórias, horas extras, férias, décimo terceiro salário e outras obrigações trabalhistas que não foram observadas durante o período em que o apresentador esteve vinculado à emissora.

Essa decisão trouxe à tona uma importante reflexão sobre a prática da pejotização e suas implicações legais. Empresas que utilizam esse modelo para contratação de profissionais devem estar atentas à legislação trabalhista e previdenciária para evitar riscos judiciais e prejuízos financeiros.

Conclusão

O caso envolvendo a TV Globo e o ex-apresentador Lair Rennó destaca a importância de uma análise criteriosa e transparente das relações de trabalho, especialmente quando se utiliza a pejotização como estratégia contratual. A decisão judicial favorável a Lair Rennó mostra que as empresas devem agir em conformidade com a legislação trabalhista e garantir que os direitos dos profissionais sejam respeitados.

É fundamental que empresas e profissionais busquem orientação jurídica e contábil adequada ao optarem pela pejotização, evitando assim ações judiciais e eventuais condenações que possam resultar de práticas inadequadas de contratação. A transparência e o cumprimento das leis trabalhistas são fundamentais para promover relações de trabalho justas e éticas, evitando problemas e custos desnecessários no futuro.

A pejotização não é exclusiva de setores específicos, ela pode ocorrer em diversos segmentos, inclusive no setor da saúde, como no caso dos médicos que optam por constituir uma pessoa jurídica para prestarem seus serviços. Além disso, profissionais de diversas áreas como jornalistas, publicitários, profissionais de TI, engenheiros, entre outros, também podem adotar esse modelo contratual. A flexibilidade e as possíveis vantagens tributárias têm atraído a atenção de muitos trabalhadores e empresas, mas é importante estar ciente dos riscos e obrigações legais envolvidos nessa prática.

Observação: Este artigo é apenas informativo e não constitui aconselhamento jurídico. Recomenda-se que empresas e profissionais consultem um advogado especializado para obter orientação personalizada sobre seus casos específicos relacionados à pejotização.

Fontes:

BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Acesso em: 24 de julho de 2023.

BRASIL. Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Acesso em: 24 de julho de 2023.

BRASIL. Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre a organização da Seguridade Social, institui Plano de Custeio e dá outras providências. Acesso em: 24 de julho de 2023.

VEJA. Globo é condenada a pagar 9 milhões de reais a ex-apresentador. Disponível em: https://veja.abril.com.br/coluna/veja-gente/globo-e-condenada-a-pagar-9-milhoes-de-reais-a-ex-apresentador. Acesso em: 24 jul. 2023.

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